Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego; Romanos 1:16.

O que é o Evangelho? Não é uma religião, não é uma seita, não é uma corrente doutrinária, não é um estilo de vida, não é uma filosofia. Todas estas coisas são criações do próprio homem. O Evangelho não é fruto de elaboração humana. Evangelho é o poder de Deus. Trata-se de uma poderosa ação de Deus e não do homem. E qual é a finalidade deste poder? Produzir salvação em nós, a salvação de todo aquele que crê na obra expiatória de Cristo Jesus, na Cruz do Calvário. E por quê? Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus. Romanos 3:23. A grande confusão está no fato de que muitas pessoas entendem que Evangelho seria Deus dizendo o que devemos fazer para "nos" salvar, ou, então, que Evangelho seria uma descrição do que Deus fez, um mero relato histórico. Evangelho não é isto, definitivamente. Tanto o primeiro caso, quanto o segundo, representam entendimentos equivocados. O primeiro, porque o poder seria nosso e não de Deus. O segundo, porque o Evangelho não é uma exposição acerca deste poder, mas é o próprio poder. Também não é história, pois fala acerca de Jesus Cristo, que é o mesmo ontem, hoje e eternamente (Hebreus 13:8), e não apenas do que ocorreu no passado.

Evangelho é um poder sobrenatural, que transcende a razão e a compreensão humanas. Ora, o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. 1ª Coríntios 2:14. A essência deste poder, que é o Evangelho, representa toda a oposição a qualquer tentativa do homem de justificar-se por suas ações, por suas obras, por seus esforços à vista de Deus. Na verdade, o homem sempre buscou alguma espécie de redenção particular, através do próprio esforço ou de suas próprias ações. Exatamente, porque na dinâmica humana, o mérito tem local de destaque. Até mesmo em relação a Deus, o homem entende que precisa obter algum tipo de mérito para que seja aceito digno diante Dele. Todavia, o método de Deus para salvação do homem não inclui nenhuma intervenção da criatura, apenas do Criador.

Por isto, então, todas as vezes que estamos diante de uma fala onde o homem precisa desempenhar algo ou cumprir condições ou regras para alcançar o beneplácito de Deus, não estamos diante do Evangelho verdadeiro, mas de uma réplica barata. No grego, Evangelho significa "boas novas", isto é, a boa notícia acerca da morte e ressurreição de Jesus Cristo. Na morte, Cristo pagou a nossa dívida. Na ressurreição, Ele nos deu a Sua vida. Ao mesmo tempo que este Evangelho é o poder de Deus, ele é também uma mensagem que ofendia tanto a judeus como a gregos. Este Evangelho fala do Salvador de toda a humanidade, de um libertador que nasceu pobre, num estábulo, criado numa pequena aldeia, treinado como carpinteiro, crucificado num madeiro como bandido e zombado até a morte. A este, o Evangelho chama de Filho de Deus.

Por esta razão, então, as pessoas têm tanta dificuldade em receber o Evangelho como a mensagem de Deus para a salvação do homem. Para os intelectuais, esta mensagem beira ao ridículo, sendo objeto de escárnio até os dias de hoje. Afinal, como aceitar que um carpinteiro de Nazaré, morto numa cruz, seja o Salvador do mundo? Todavia ... Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são. 1ª Coríntios 1:27-28.

Evangelho é o método de Deus para a salvação, não o método do homem. E o método de Deus é incompreensível para qualquer mente humana, até mesmo a mais privilegiada, inteligente, culta e sábia. Não se enganem. Se algum de vocês pensa que é sábio segundo os padrões desta era, deve tornar-se ‘louco’ para que se torne sábio. Porque a sabedoria deste mundo é loucura aos olhos de Deus. Pois está escrito: ‘Ele apanha os sábios na astúcia deles. 1ª Coríntios 3:18-19 (NVI). Deus escolheu este método incompreensível de salvação, exatamente porque Ele não faz qualquer acepção de pessoas, nem leva em conta os seus predicados. Porque para com Deus não há acepção de pessoas. Romanos 2:11. O método do homem é sempre o método das obras, não da graça. O método do mérito, não do esvaziamento. O método da competição, não da cooperação. Se Deus houvesse escolhido o método humano de salvação, apenas os medalistas de ouro, alicerçados no seu próprio desempenho, alcançariam a salvação. Mas o propósito de Deus é alcançar a todos, indistintamente. Até porque todos estão debaixo do pecado, sem exceção, e não há nem um justo, nenhum sequer (Romanos 3:10).

O pregador e médico, Dr. Martyn Lloyd-Jones, assim escreveu: "o mundo atribui grande significação à mente, ao intelecto, à instrução, ao entendimento, ao esforço moral, gloriando-se nestas coisas. Mas o Evangelho não. Não significa que o Evangelho está dizendo que o homem capaz deva cometer suicídio intelectual, que ele não pode ser cristão. Significa, sim, que não importa quão capaz um homem seja, só isto não fará dele um cristão. O Evangelho coloca o homem capaz no mesmo nível daqueles a quem falta intelecto, reduzindo todos a um nível comum".

Não é pelo conhecimento que o homem é salvo, mas pela fé no Evangelho de Cristo Jesus. Visto como, na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por sua própria sabedoria, aprouve a Deus salvar os que crêem pela loucura da pregação. 1ª Coríntios 1:21. Até porque o que o homem precisa não é de conhecimento, mas de poder. O conhecimento puro e simples da Bíblia, mata: ... porque a letra mata, mas o espírito vivifica. 2ª. Coríntios 3:6b. ... porque o nosso evangelho não chegou até vós tão-somente em palavra, mas, sobretudo, em poder, no Espírito Santo. 1ªTessalonicenses 1:5a. Este método escolhido por Deus, que é o Evangelho, não considera aquilo que representa a jóia mais preciosa para o homem, o motivo do seu orgulho: a justiça própria. O Evangelho não se gloria no intelecto, nem no esforço pessoal. O homem pode fazer tudo o que quiser e de nada lhe valerá, pois a sua justiça é como "trapo de imundície" (Isaías 64:6).

A loucura do Evangelho pode ser resumida no que o apóstolo Paulo escreveu aos cristãos em Éfeso: porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Efésios 2:8-9. A salvação não vem das obras que o homem realizar ou deixar de fazer, porque se assim fosse, ele teria do que se gloriar, do que se exaltar. Só que a glória da salvação é de Deus e Ele não a divide com ninguém. Na época do apóstolo Paulo, esta mensagem era um escândalo para os judeus, uma pedra de tropeço. E para os não judeus, ou seja, para os gentios, era loucura. ... mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os gentios. 1ª Coríntios 1:23. Mas ambos, judeus como não judeus, precisavam dela. Assim como hoje, tanto o homem religioso, o judeu de antigamente, como o homem natural, o gentio de outrora, ambos precisam deste Evangelho de morte e ressurreição.

Religião é tudo aquilo que o homem faz para tentar alcançar Deus, isto é, mediante o próprio esforço. Diferentemente, Evangelho é Deus, por sua infinita graça e misericórdia, buscando o homem pecador, no seu demérito. O homem religioso de hoje pode ser comparado com o judeu da época do apóstolo Paulo. Muito embora Paulo seja conhecido como o apóstolo dos gentios, ele teve grande parte de seu ministério dedicado à evangelização de seus conterrâneos judeus. Parece até um paradoxo falar de evangelismo do próprio povo de Deus, a nação judaica. Mas eles precisavam desta mensagem, tanto quanto os gentios. Uma das piores conseqüências do pecado, é o fato de que nós podemos ver o pecado claramente nos outros, contudo achamos muito difícil enxergar estas mesmas coisas em nós. No nosso caso, estamos sempre prontos a nos escusar, a dar explicações, a nos justificar, alegando que, no nosso caso, é diferente. Ninguém consegue enxergar o próprio erro, ninguém é culpável a seus próprios olhos. Sempre estão encontrando alguma explicação a respeito.

Em 2º Samuel 12, encontramos o profeta Natã tratando do pecado do rei Davi. Natã falou ao rei acerca de um homem cruel e voraz que, para poupar o seu rebanho, matou a única cordeirinha de um homem pobre para atender a um hóspede inesperado. E Davi encheu-se de justa indignação e disse: "eu juro pelo SENHOR, o Deus vivo, que o homem que fez isso deve ser morto!" (verso 5). Davi acreditava naquilo, tendo sido honesto e sincero. Disse então Natã a Davi: "esse homem é você" (verso 7). Quando se tratava de alguém tomar uma ovelha, Davi podia ver. Mas quando se tratava de tomar a mulher alheia, Davi não enxergou o próprio pecado. Davi não estava sendo hipócrita, ele realmente não tinha visto o problema. Esta é a dificuldade: o pecado nos cega, nos perverte e nos derrota.

Os judeus achavam, em sua ignorância e cegueira, que não precisavam deste Evangelho de morte e ressurreição. Não conseguiam enxergar o próprio pecado, apenas os dos outros. Estavam assentados em três pilares: a aliança que Deus fizera com Abraão, através da circuncisão; a lei que fora confiada a eles; e, o fato de Deus haver escolhido os judeus como seu povo. Mas tudo isto não foi nem é suficiente para a sua salvação. O que nos salva é este Evangelho da fé em Jesus Cristo e este crucificado. Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego; Romanos 1:16. Será que não estamos agindo como os judeus? Assentados em pilares que não sejam a fé neste Evangelho de morte e ressurreição? No alto de nossa soberba, estamos prontos a denunciar os outros, a julgá-los e a condená-los. Agimos como se estivessemos nas funções de promotores e juízes. Portanto, és indesculpável, ó homem, quando julgas, quem quer que sejas; porque, no que julgas a outro, a ti mesmo te condenas; pois praticas as próprias coisas que condenas. Romanos 2:1.

Se a nossa atitude, como pretensos cristãos, tem sido como a dos judeus, precisamos do Evangelho tanto quanto o ímpio, o descrente. O Evangelho é o método gracioso de Deus para salvação e libertação do homem. Você e eu podemos estar vivendo uma vida de religião, um falso evangelho embasado no desempenho. Misericórdia! Lembre-se: você não pode "des+empenhar" nada, pois Cristo já "des+empenhou" tudo, morrendo na cruz. (Um dos significados do verbo desempenhar é resgatar, livrar de dívidas).

Fernando E. Prison